terça-feira, outubro 19, 2004

Mulheres de 30

Numa conversa de mulheres surgiu a ideia de irmos ver a peça “Confissões das Mulheres de 30”, decidimos ir, e fomos. Não só mulheres, mas essencialmente mulheres já na década dos 30.
A peça com Fernanda Serrano, Margarida Marinho e Maria Henrique, anunciava-se como uma comédia baseada em testemunhos reais que pretenderia abordar temas como o amor, o primeiro namorado após a separação, filhos, ex-maridos, tipos de homem no Amor, grandes sonhos, sexo, mercado de trabalho, a preocupação com a maturidade.
A primeira coisa que se pode pensar é porque razão uma mulher ou um grupo de mulheres decide ir, e consegue até convencer homens a ir, ver e ouvir aquilo que ouve e vê todos os dias no seu quotidiano e no quotidiano das suas semelhantes?
A ideia é mesmo essa: é ver e ouvir as “outras” a falarem disso. O que não deixa de ser real, e de ter lugar na nossa realidade, mas que é dito e feito por outras que não nós ou as nossas amigas parece sempre mais distante e, por isso, mais aceitável.
Por outro lado, porque é muito mais fácil lidar com a realidade, com a dureza e crueza que esta possa ter, quando a realidade nos é trazida com humor. Essa, foi, aliás a receita que Stand-Up Tragedy cozinhou com enorme mestria.
Pois bem, em “Confissões das Mulheres de 30” o humor residiu mais na interpretação das actrizes do que no próprio texto, o que para mim é uma receita mais pobre e menos saborosa.
Das interpretações sublinho o espanto que me causou a Maria Henrique, a única das actrizes que veste uma personagem com características vincadas do início ao fim da peça: a problemática, cheia de tiques nervosos, que sempre visitou e precisou de “pssssciiiicanalisssstas” e que até por estes é rejeitada, e que, solteirona, não consegue distinguir uma noite de aventura no Requinte de uma noite de amor. Mas que não deixou de representar espectacularmente a empregada doméstica açoriana, com uma pronúncia hilariante e ainda por cima acusada de ser “puta” (imaginem só isto dito por um continental a tentar pronunciar à micaelense).
No geral, a peça embora bem conseguida em humor e confissões de mulheres, esteve longe de esgotar a mulher de 30.
Porque se centrou na cosmética (nesta parte fiquei com dúvidas quanto às minhas hormonas ou quanto à minha data de nascimento), nas mudanças corporais, na intriguice que sempre existe na amizade entre mulheres, na mulher de 30 frustrada porque solteira ou divorciada ou porque sem filhos, no sexo, nos homens, no sexo, nos homens, no sexo, nos homens, no sexo, nos homens.
Não, não foi tanto assim, mas foi quase.
Faltou a mulher sem frustrações, a casada, com ou sem filhos, a polivalência da mulher, a vontade de, mesmo a mais certinha, cometer loucuras…
E muito mais, porque afinal a Mulher, tal como o Homem, são um poço sem fim com muito a explorar.
No final, duas mensagens.
Uma que no fundo retrata a perspectiva que me pareceu pretender ser focada: “ter 30 anos é uma posição de abrangência estratégica: pode namorar homens de 20, 30, 50... sem que ninguém lhe chame tarada".
Outra, que é a perspectiva que em geral julgo estar correctíssima: “a mulher de 30 já perdeu a inocência, mas ainda lhe falta ganhar a sabedoria” (palavras proferidas por Raul Solnado num excerto reproduzido em tela no final).
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